O mundo vive em uma época marcada por desafios sociais e ambientais urgentes. Neste contexto, encontrar soluções viáveis para a construção civil de baixo carbono é um desafio complexo. “A academia e a indústria têm proposto diversas soluções técnicas, mas muitas vezes esbarram em questões de custo e aceitação social”, afirma Vanderley M. John, engenheiro e professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
Durante a Concrete Show 2023, John destacou que o momento é de pragmatismo. “Precisamos de soluções urgentes que sejam escaláveis e viáveis economicamente”, declara.
Veja algumas medidas para reduzir as emissões de CO2:
Mensuração do impacto ambiental
O primeiro passo é encontrar formas de mensurar quantitativamente o impacto ambiental da construção. Para John, esse é um dos fatores primordiais. “Quando colocamos um número, fica mais fácil de se orientar e tomar uma decisão mais assertiva”, explica.
Uma das ferramentas com este objetivo é a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), que considera que todas as ações humanas têm múltiplos impactos ambientais e que estes ocorrem ao longo do ciclo de vida. “Ela faz um inventário quantitativo dos fluxos antropogênicos de materiais e energia. No entanto, o inventário completo é caro e demorado. E, na prática, acabam sendo utilizados dados secundários, que não refletem processos da empresa e não ajudam na melhoria. Ainda, faltam benchmarks representativos do mercado e o excesso de indicadores dificulta tomada de decisão. Portanto, a ACV completa não é adequada para melhorar os processos reais de produção”, destaca John.
Para resolver estas questões, foi desenvolvido o Sistema de Informações para o Desempenho Ambiental da Construção (SIDAC), uma metodologia padronizada e acessível baseada na ACV. De acordo com John, o SIDAC simplifica a avaliação do desempenho ambiental da construção, fornecendo dados de qualidade e uma interface de fácil compreensão para profissionais e consumidores. Ele permite calcular a pegada de carbono, selecionar fornecedores, estabelecer benchmarks e promover a governança ambiental.
Circularidade
Uma das alternativas para a mitigação do CO2 é o aumento da circularidade. Mas, segundo John, também é um grande desafio para a indústria do cimento.
“A circularidade do aço já é elevada, mas a dos materiais cimentícios não. O aço tem muito mais valor agregado dos metais. É complicado reciclar materiais cimentícios. Dá pra fazer areia de qualidade com resíduos de construção. A indústria do cimento ainda não usa os seus próprios resíduos na fabricação de cimento. Essa é uma questão que precisa ser resolvida. E o destino do resíduo de construção no Brasil é um pouco dramático. As recicladoras coletam 48%, mas eles só conseguem vender 16% como agregado. A recicladora leva o resto para o aterro. Então, tem problemas de mercado muito sérios”, pontua John.
John também menciona a circularidade de edifícios. “As casas de madeira são claramente circulares. Mas como eu poderia fazer a circularidade do pré-moldado? Acho que isso poderia ser um tópico de discussão. Eu precisaria reusar as peças, trabalhar com conceito de vida útil. Isso é um potencial único do pré-moldado. O moldado in loco não tem chance neste departamento, é muito mais complicado”, justifica.
Gestão de resíduos
Uma das coisas importantes em gestão de resíduos são as perdas. “Temos que acabar com as soluções construtivas que são inerentemente desperdiçadoras, porque elas geram resíduos. A industrialização trabalha nessa linha, ela reduz a geração de resíduos. Ela tem o potencial de adotar conceitos de estruturas mais leves, como o UHPC ou a impressão 3D. Isso facilita a desmontagem e também a desmaterialização. E nós podemos também ter enormes linhas de produtividade. A cadeia do cimento é pouquíssimo industrializada”, argumenta John.
Industrialização
A cadeia do cimento tem a meta de desmaterializar 20% em 2050. “É um número bastante alto. É possível reduzir resíduos de construção e recursos naturais por meio da industrialização, já que ela promove a reutilização de componentes e ainda traz ganhos de produtividade”, aponta John.
Hoje, cerca de 70% das habitações são construídas de forma amadora, segundo John. O desafio que fica para o setor é como industrializar este percentual que ainda usa cimento em saco. “Como eu entro neste mercado? Como eu baixo o impacto ambiental deste setor? Industrializar é a única saída. Hoje, não dá para convencer um pedreiro a adotar métodos modernos de dosagem ou entregar concreto usinado no meio de uma comunidade. No entanto, esta é uma oportunidade para o setor e precisamos fazer chegar lá”, destaca John.
Aço de alta resistência
De acordo com John, é possível materiais que têm potencial de mitigar CO2, como por exemplo o aço de alta resistência.
Matéria publicada no Massa Cinzenta