A taxa de câmbio é uma das variáveis de conjuntura econômica mais relevantes e mais difíceis de prever. As expectativas sobre esse indicador raramente são confirmadas, mesmo em horizontes de projeção de apenas alguns meses.
Comprovando essa percepção, desde o último dia útil de 2021, a taxa de câmbio real/dólar já recuou mais de 14% e esse movimento está resultando na progressiva revisão das projeções para o final de 2022. Na edição de 28 de março, a mediana das expectativas de mercado divulgadas no Relatório Focus sugeria que o dólar encerraria o ano em R$ 5,25.
Assim, somente na reunião deste mês de março o Federal Reserve dos EUA iniciou o ciclo de elevação da taxa de juros naquele país. A alta de 0,25 ponto percentual foi a primeira desde 2018. Em paralelo, mesmo com a eclosão do conflito na Ucrânia, o risco-país brasileiro tem estado relativamente baixo e estável, permanecendo em torno de 315 pontos base ao longo de março. Juros em alta com risco baixo atraem capitais de curto prazo e a elevação da oferta de dólares no mercado local derruba a taxa de câmbio.
A questão que se coloca é se essa queda tende ou não a se manter. O receio de uma nova onda de elevação é comprovado pela expectativa do Focus para o final de 2022, que está sendo reduzida de forma apenas progressiva. E isso remete ao cenário internacional.
O conflito entre Rússia e Ucrânia exacerbou a tendência de revalorização do real frente ao dólar por meio de duas vias: a primeira se refere à retirada da Rússia do sistema financeiro internacional, o que reduziu as opções de destino para os capitais de curto prazo; além disso, a guerra também contribui para manter elevados os preços das commodities de exportação brasileiras.
Em um cenário de resolução do conflito, é possível imaginar que esses preços – por natureza muito voláteis – possam cair rapidamente. Mas o retorno da Rússia aos mercados de capitais não deve ocorrer a curto prazo, mesmo frente a um suposto e desejado encerramento da guerra. Em paralelo, não se vê no horizonte a reversão da alta da Selic no Brasil, dado que a inflação deverá permanecer acima do teto da meta pelo menos até o final deste ano.
Em síntese: a guerra na Europa acelerou a tendência de revalorização da moeda brasileira, que já era esperada por força da alta da Selic; no entanto, mesmo que seja superado no curto prazo, o conflito deixará uma herança que deve manter o dólar no Brasil em níveis mais baixos do que os registrados ao longo dos dois últimos anos.
Matéria publicada no Sinduscon-SP