A previsão de que o PIB da construção cresça 3% neste ano ainda está mantida, mesmo considerando uma desaceleração da atividade. Mas esta projeção não se concretizará se a escalada de preços dos materiais do setor prosseguir comprimindo as margens das construtoras, chegando a paralisar obras, reduzindo as compras desses insumos, e provocando demissões de pessoal.
Esta foi o cenário traçado por Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção do FGV/Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), na Reunião de Conjuntura do SindusCon-SP. O encontro virtual foi conduzido pelo vice-presidente de Economia da entidade, Eduardo Zaidan, com a participação do presidente Odair Senra, em 8 de junho.
Segundo a economista, se esse crescimento projetado do setor se confirmar, teremos um aumento do PIB da construção por dois anos (2021 e 2022). Mas para ela, a questão é a continuidade deste crescimento em 2023. As obras do mercado imobiliário deverão se estender, porém com redução do volume contratado no programa Casa Verde e Amarela (CVA). Haverá obras derivadas das concessões, mas os recursos dos Estados para novas obras de infraestrutura deverão diminuir. Preocupa também o efeito dos saques do FGTS no financiamento à habitação, acrescentou.
Em sua apresentação, Ana Castelo apontou que os aumentos dos preços dos materiais desaceleram, mas não com a rapidez imaginada. Em paralelo, começam a se sentir os efeitos dos reajustes salariais no INCC. Os itens que mais subiram no ano foram elevadores e cimento. Os preços do aço, que vinham desacelerando, dão sinais de retomada de crescimento. Para este ano, a projeção é de que o INCC cresça cerca de 12%, acima da previsão anterior.
De acordo com a economista, o aumento do emprego na construção neste ano mostra que a atividade do segmento formal do setor segue em alta, puxada por edificações e serviços. A elevação dos preços dos insumos pode estar levando ao desempenho mais tímido das obras de infraestrutura. Já a última Sondagem da Construção da FGV mostra uma percepção positiva do segmento de obras viárias.
A Sondagem mostrou que o custo dos insumos segue como principal preocupação, acima do quesito da demanda insuficiente. As vendas do mercado imobiliário demonstram resiliência, mais localizadas no segmento de médio e alto padrão, que não sofreu tanto o efeito do aumento da taxa de juros como o segmento econômico. As correções feitas pelo governo no CVA podem mitigar a diminuição das contratações, mas ainda assim a queda da renda das famílias preocupa, prosseguiu Ana Castelo.
Queda dos investimentos
Ela explicou que a construção não foi a responsável pela queda dos investimentos no primeiro trimestre, e sim o segmento de máquinas e equipamentos. O crescimento de 0,8% do PIB da construção contribuiu para arrefecer a queda dos investimentos, comentou.
Segundo a economista, este crescimento derivou em parte de um efeito carregamento do trimestre anterior. O impulso, segundo o IBGE, teria saído das obras de infraestrutura, mas na opinião de Ana Castelo, este não foi o motivo principal. Serviços especializados e edificações tiveram mais peso, observando-se os dados do crescimento de postos de trabalho gerados, especialmente os informais. As obras de reforma, manutenção e autoconstrução mostram resiliência, impulsionando o comércio de materiais e contribuindo para o aumento do valor agregado no trimestre da construção, prosseguiu.
O crescimento da produção física de materiais de construção ficou em 0,6% no primeiro trimestre, na comparação com o último trimestre do ano passado, porém bastante inferior ao mesmo período do ano passado. Portanto, a massa salarial e a recuperação dos postos de trabalho estão sendo a força motora do crescimento. Entretanto, em termos físicos (não em faturamento), as vendas de aço e cimento mostram queda, de acordo com a economista.
Robson Gonçalves, professor da FGV, analisando os dados do PIB do primeiro trimestre, manifestou preocupação com a queda dos investimentos. Segundo ele, o crescimento do PIB nacional derivou mais da descompressão da atividade de setores como o de outros serviços (barbearias, restaurantes, turismo etc.), o que por si só não lhe dá força para se sustentar. Basicamente, ainda não se percebe um aumento em relação a 2022.
Para 2023, espera-se uma arrumação pós-eleição nas contas públicas, acrescentou o economista. No exterior, os analistas estão divididos entre prever uma desaceleração e uma recessão global. A elevação de juros nos EUA, a guerra da Rússia X Ucrânia e os lockdowns da China prosseguem. O efeito de freio na economia nos mercados americano e europeu já está em curso. De acordo com Gonçalves, o cenário hoje está mais para uma desaceleração.
Matéria publicada no Sinduscon-SP