O governo apresentou sua versão do projeto de lei que institui no país um mercado regulado de carbono para impor limites compulsórios de emissões de gases de efeito estufa para setores e empresas.
Depois de pelo menos cinco PLs e mais de três anos de idas e vindas, a expectativa é que a legislação seja finalmente aprovada, como um componente do chamado Plano de Transição Ecológica.
O projeto prevê a criação de um sistema conhecido como cap-and-trade, semelhante ao que vigora na União Europeia desde 2005. Os ativos de carbono são definidos como ativos mobiliários – sob o guarda-chuva da CVM – o que permite a criação de novos produtos financeiros.
Os direitos de populações indígenas e tradicionais, muitas vezes afetadas por projetos de geração de créditos de carbono do mercado voluntário, também estão contemplados no texto.
O funcionamento do mercado regulado
O ponto central do projeto, apresentado como substitutivo do PL-412 e relatado pela senadora Leila Barros (PDT-DF), é o mecanismo do mercado regulado de carbono e sua governança.
O órgão regulador – batizado de Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa, ou SBCE – fica responsável por determinar os setores da economia sujeitos a tetos de emissões e por conceder (ou vender em leilões) permissões de emissão às empresas.
Cada uma dessas autorizações de emissão, chamadas de Cotas Brasileiras de Emissões (CBE), equivale a uma tonelada de CO2 ou o equivalente em outros gases de efeito estufa.
Se a companhia emitir mais que as CBEs que tem em mãos, precisa ir ao mercado adquirir Certificados de Redução ou Remoções Verificadas de Emissões para fechar a conta.
A empresa que emitir menos do que tinha direito – ou seja, tiver uma sobra de CBEs – pode vender o excedente para outra que esteja com saldo negativo.
Os primeiros alvos dos mercados regulados usualmente são as indústrias mais poluentes, tais como siderurgia, cimento e petroquímica. Mas o PL ainda não definiu setores, algo que ficará para a fase de regulamentação da lei.
“Parece algo deixado de fora propositadamente, pois ainda haverá muito debate sobre isso”, diz Renata Amaral, sócia do escritório de advocacia Trench Rossi Watanabe e especialista em meio ambiente.
Ela menciona o agronegócio. De um lado existe pressão para que as emissões do campo sejam limitadas; de outro, há uma resistência enorme tanto dos produtores quanto da bancada que representa esse interesse no Congresso, argumentando que o setor não é regulado em lugar nenhum do mundo.
Mas há uma referência no texto do PL a dois patamares numéricos de emissões (em milhares de toneladas de CO2 equivalente emitidas anualmente, ou tCOe).
Quem passar do primeiro deles – 10 mil tCO2e – teria a obrigação de apenas prestar contas. Já o segundo – 25 mil tCO2e – implica imposição de limites, dependendo de condições como setor de atuação, tamanho da empresa e assim por diante.
Uma potencial diferença do modelo brasileiro em relação a outros mercados regulados é a possibilidade de uso de créditos de carbono do mercado voluntário nessa conciliação. Mas isso ainda não está totalmente claro.
O texto afirma que créditos de desmatamento evitado, de longe os mais comuns no país hoje, podem ser utilizados desde que suas metodologias sejam credenciadas pelo órgão regulador.
O projeto menciona que devem ser observados “os limites estabelecidos no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e as diretrizes da Comissão Nacional para REDD+ (CONAREDD).”
Matéria publicada na Abrainc