Em entrevista à Revista Indústria Brasileira, o presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Renato de Sousa Correia, responde cinco perguntas sobre a infraestrutura brasileira. Correia pontua que o maior desafio que as empresas de engenharia enfrentam é a mão de obra, que tem sido cada vez mais escassa.
Quais são os principais desafios das empresas de engenharia pesada no Brasil atualmente?
Atualmente, o que preocupa a maioria dos empresários é a questão da mão de obra. Em recente pesquisa, foi apontado que o número de entrantes da construção civil é muito pequeno em relação ao que era no passado. Há um envelhecimento na idade média de ajudantes, mestres de obra e engenheiros.
Como há menos mão de obra, surge outro ponto de preocupação: a necessidade de mais processos industrializados. Entretanto, o Brasil ainda está muito incipiente em relação a esses dois grandes desafios. É preciso que o setor seja atrativo para a mão de obra mais jovem. E, para isso, ele precisa ser mais moderno e mais industrializado.
Como o novo PAC foi recebido pelo setor?
O programa deve ajudar a alavancar a industrialização? Eu estive presente no lançamento do novo PAC no Rio de Janeiro. No geral, vimos esse anúncio com bons olhos. Percebemos que o governo tentou corrigir problemas das edições anteriores.
Tenho dito que é sempre importante dar um primeiro passo, e ele foi dado, ou seja, você tem um programa de aceleração do crescimento, com diretrizes e valores para cada setor. Existe um plano inicial, mas é óbvio que, para dar certo, tem que continuar fazendo o dever de casa. As obras precisam efetivamente acontecer, os valores que forem executados precisam ser pagos.
O novo PAC deve priorizar parcerias com o setor privado. Como a CBIC avalia essa diretriz?
O governo fala em R$ 1,7 trilhão em recursos, estimulando o investimento privado e fomentando a integração entre este e o investimento público. Nesse PAC, o setor privado entra com o maior quinhão de recursos. O programa busca a expansão e a qualificação da infraestrutura, para aumentar a competitividade e o crescimento do país com responsabilidade fiscal.
As premissas são boas. Agora, precisa levar isso a cabo e promover um desenvolvimento inclusivo, social e regional. Também precisa integrar o investimento em infraestrutura com processos de neoindustrialização e transição ecológica, ampliar o acesso da população ao serviço público de qualidade e fomentar a geração de emprego e renda. Eu acho que é um bom início e precisamos ajudar a fazer dar certo.
Como o senhor acha que podemos retomar as cerca de mil obras públicas que estão paradas?
Eu acho que este é o grande desafio da sociedade brasileira: entender as causas desse verdadeiro desastre para o país. O dinheiro alocado vai se deteriorando, porque uma obra não concluída, exposta ao tempo, vai se deteriorar, e vai ficar muito mais cara. É mais caro retomar uma obra do que começar do zero.
Há várias causas para esse problema, que o próprio Tribunal de Contas da União (TCU) aponta. Há questões relacionadas à qualidade dos projetos e à própria licitação por menor preço, às vezes feita em pregão eletrônico. Esse é um processo que gera muitas dúvidas e temos certeza de que não é adequado a obras de engenharia.
É preciso conversar tanto com o governo quanto com órgãos de controle para que possamos rever o processo de licitação pública, sem pregão eletrônico e evitando as interrupções de pagamento.
Quando você executa uma obra e não recebe, é claro que ela será paralisada. A CBIC tem trabalhado junto ao TCU para que as concessões com problemas possam ser reequilibradas e reconduzidas eventualmente, antes de se decidir por começar tudo de novo.
Algumas diretrizes presentes no novo PAC podem sanar esse gargalo?
Sim, essa é a expectativa, mas é preciso ter alguns cuidados adicionais: entes públicos, governos municipais, estaduais, governo federal, cada um tem que cumprir a sua parte. Esperamos que isso seja realmente feito, que ninguém atrapalhe a conclusão das obras, que elas possam ser entregues à população.
O Brasil precisa muito priorizar a infraestrutura. Você tem 50% da população sem coleta e tratamento de esgoto e 30 milhões de brasileiros sem tratamento de água. A cada real que você investe em saneamento, você economiza três em gastos na saúde.
A infraestrutura de um país, quando bem implementada, melhora a competitividade dele em relação ao comércio mundial.
Por isso, enxergamos a infraestrutura como um instrumento de melhoria de vida para a população, sem contar a habitação, que também está dentro do PAC: morar dignamente é uma condição básica para o ser humano desenvolver outras atividades.
Artigo publicado no Portal da Indústria