O PIB da indústria da construção deve crescer cerca de 6,1% em 2022 e algo deste ciclo de crescimento será carregado para 2023. Entretanto, a incerteza em relação à futura política econômica do Executivo, a falta de recursos para investimentos públicos e a polarização no Legislativo e no país anteveem tempos difíceis.
Este foi o panorama apresentado na Reunião de Conjuntura do SindusCon-SP, conduzida pelo vice-presidente de Economia, Eduardo Zaidan, com a participação do presidente da entidade, Odair Senra.
Zaidan analisou que a percepção otimista da indústria da construção sobre sua atividade atual resulta de um momento de negócios que já passou. A dúvida é se este momento continuará propício ao setor. Falta clareza sobre a política econômica a ser adotada e como ela impactará a taxa de investimento, que afeta de forma direta a construção, comentou.
“Cobrar uma política responsável para um governo que se inicia é um dever que temos. Para o reequilíbrio das contas públicas, é preferível pagar uma conta maior agora e menor no futuro. Mas a polarização está mais aguda. Metade da população estará contrariada, e o próximo presidente da República terá dificuldade, vai descontentar muita gente; tempos mais difíceis virão, seja quem for o eleito.”
Além disso, a construção terá de se organizar para enfrentar a falta de mão de obra especializada – um problema estrutural, a seu ver.
Discurso vazio
De acordo com Robson Gonçalves, professor da FGV, são vazios os discursos das duas candidaturas à Presidência da República sobre a condução da futura política econômica. “O atual ministro da Fazenda afirma que, para o equilíbrio das contas públicas, terá como meta a relação dívida pública/PIB, sem explicar como. A outra candidatura não falou nada e começa a soltar balões de ensaio.
Gonçalves atribuiu a forte elevação da Bolsa, ocorrida no dia seguinte à eleição do primeiro turno, ao fato de o mercado de capitais estar animado com as perspectivas econômicas, independentemente de quem se eleger, por conta do futuro Congresso majoritariamente conservador.
“Entretanto, estamos diante de um processo de dominância fiscal, onde a política monetária é reflexo do desequilíbrio das contas públicas, com manutenção dos juros altos por mais tempo. Já na dominância monetária, a taxa de juros sobe ou desce de acordo com a inflação, o que possibilita um aumento dos gastos públicos quando a taxa cai. Há necessidade de restaurar a liderança da política monetária, mediante a busca do reequilíbrio fiscal, com preservação da autonomia do Banco Central”, afirmou.
Para que a solução para o aumento da dívida pública não ocorra mediante a ‘argentinização’ da economia – na qual o governo argentino não consegue financiar o déficit público, monetiza a dívida e eleva a inflação em 100% ao ano –, é importante se colocar em pauta a redução dos gastos públicos, iniciando-se com uma reforma administrativa. Já a reforma tributária é incerta no curto prazo, mas poderá ensejar uma perda no curto prazo para a obtenção de um ganho a longo prazo”, afirmou.
Comentando a falta de mão de obra especializada na indústria da construção, Gonçalves atribuiu o problema à falta de política pública educacional voltada ao crescimento econômico.
O desempenho da construção
Em sua apresentação, Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), mostrou o crescimento de 10,5% do PIB da construção no acumulado de 12 meses até o final de junho deste ano. Ela informou que o Ibre/FGV projeta crescimento de 6,1% do PIB do setor, e de 2,5% para o PIB nacional.
A economista mostrou que, de um lado, as vendas e a produção de materiais de construção caíram em torno de 8% desde o início do ano: as vendas, por conta da queda na demanda das famílias; e a indústria sofre em parte com a queda da demanda do comércio, mas o declínio não é tão significativo. O consumo de cimento também apresenta queda, mas se mantém acima do cenário de antes da pandemia.
Já a população ocupada na construção (com e sem carteira assinada) mostra crescimento de 7%, estando em patamar acima daquele de antes da pandemia. E o emprego com carteira no setor até o final de agosto mostra a criação de 248 mil novos empregos formais em 12 meses, contribuindo fortemente com a geração de empregos na economia.
Ana Castelo informou que, no mercado imobiliário, as vendas continuaram crescendo fortemente no primeiro semestre, especialmente no segmento de médio e alto padrão. Na cidade de São Paulo, as vendas vêm crescendo neste segmento, porém caindo no segmento econômico. O ritmo de crescimento dos lançamentos desacelerou.
Já no Casa Verde e Amarela, as contratações aumentaram no Grupo 3 e caíram nos outros dois, depois dos ajustes feitos pelo governo no programa. Beneficiar a classe média com este programa é questionável em termos de política pública, na opinião da economista.
Ela ainda mostrou que as unidades habitacionais financiadas com os recursos da Poupança mantêm o patamar do ano passado, permanecendo elevadas nos imóveis novos. Os preços destes imóveis seguem em alta em capitais de Estado como São Paulo. E o endividamento das famílias seguiu se elevando e alcançou o patamar máximo em julho.
Já a confiança dos empresários da construção passou para o campo do otimismo moderado, de acordo com a Sondagem da Construção da FGV, resultado significativo segundo Ana Castelo, com mais ênfase nos indicadores de expectativas para os próximos três a seis meses.
Ela anteviu um cenário difícil para atividade futura do segmento de obras públicas: há escassos recursos no Orçamento da União e as finanças estaduais deverão sofrer com as recentes desonerações feitas pelo governo federal.
De acordo com Ana Castelo, os investimentos privados em infraestrutura não estão substituindo a ausência dos recursos públicos. O Orçamento não está prevendo gastos de cerca de R$ 200 bilhões já sinalizados pelo atual governo e as contratações do Grupo 1 do Casa Verde e Amarela sofrerão paralisação.
Matéria publicada no Sinduscon-SP