A cesta das variáveis que impacta a economia e a indústria da construção está maior que nos últimos anos. Há uma reorganização logística precária, a China nunca foi tão importante como é hoje, a guerra da Rússia contra a Ucrânia provoca desabastecimento de óleo, gás e trigo, e no Brasil há esgotamento da capacidade de investimento do poder público. A renda tem caído, a taxa de juros vem subindo muito, há dependência grande de financiamento de bens de consumo, afastando a possibilidade de uma recuperação um pouco mais sustentada da economia.
A análise foi feita por Eduardo Zaidan, vice-presidente de Economia do SindusCon-SP, na reunião de Conjuntura da entidade, conduzida por ele, com a participação do presidente da entidade, Odair Senra, em 4 de maio.
De acordo com Zaidan, a redução do pessimismo que se vê nas sondagens da construção é muito mais uma esperança, no sentido de que a conjuntura não pode ficar pior do que já está. “Estamos aumentando o grau de dependência do exterior, os salários estão mais baixos, a população está cada vez mais deseducada, dificultando a produtividade. O cenário eleitoral não vai se definir antes de agosto e até lá haverá incerteza. Após a eleição teremos um ajuste [na condução da política econômica] no primeiro ano de mandato do novo governo, que talvez não seja favorável à indústria da construção. E há notícias de que construtoras já informam às incorporadoras a necessidade de reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos”, afirmou o vice-presidente.
“Há muitas dores a enfrentar”, comentou Odair Senra, informando que o SindusCon-SP iniciou uma nova rodada de reuniões com fornecedores da indústria da construção, para estudar como mitigar os efeitos das elevações de preços dos materiais.
Percepção e realidade
Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção do FGV/Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), observou em sua apresentação que a abertura progressiva das atividades pode ter influenciado percepções positivas dos empresários, captadas na Sondagem da Construção da FGV em abril, que diminuíram o grau de pessimismo do setor. O Indicador de Expectativas se elevou mais que o de Situação Atual. O Índice de Incerteza está em nível pré-pandemia.
Segundo a economista, alguns fatos preocupam. O aumento dos preços dos imóveis novos reflete em grande parte o aumento dos custos dos materiais. O volume de crédito imobiliário declinou, com mais intensidade nos imóveis novos, motivado pela diminuição de renda das famílias e pelos critérios mais restritivos dos bancos nas concessões de financiamentos. As obras de infraestrutura não estão crescendo muito, apesar do ano eleitoral.
Estimativa da FGV situa o crescimento do PIB da construção (incluindo o setor informal) em 12% no acumulado de 12 meses fevereiro para 2022. Entretanto, Ana Maria considera prematuro fazer uma revisão da estimativa anterior de crescimento do PIB da construção para 2022, de cerca de 4%, uma vez que a produção e o comércio de materiais vêm se reduzindo.
Apesar da inflação resiliente, acrescentou, pode ser que as medidas de estímulo ao consumo acabem elevando a produção e o comércio de materiais. Se não houver novos sobressaltos, ela estimou que o INCC deverá fechar o ano com elevação de cerca de 10%.
O custo dos materiais voltou a ter mais assinalações que a demanda insuficiente, na Sondagem da Construção. Embora o ritmo de aumento dos preços desses insumos esteja em ritmo inferior ao do ano passado, eles ainda se mantêm em níveis elevados, pressionando os custos das obras, observou Ana Maria.
Ela informou que o Banco Mundial projeta uma elevação dos preços de commodities, com exceção do minério de ferro. O cenário é complexo, por conta das consequências das altas de juros no Brasil e nos Estados Unidos sobre o câmbio. E neste mês devem ocorrer os reajustes de salários na construção.
Eduardo Capobianco, representante do SindusCon-SP na Fiesp, atribuiu a paralisação dos investimentos privados nas concessões rodoviárias à discussão, com as agências reguladoras, do desequilíbrio econômico-financeiros dos contratos, motivado por fatores como o aumento do preço do asfalto. Novas licitações para concessões não se realizaram por conta do aumento do custo dos investimentos, acrescentou.
Confronto de populismos
Robson Gonçalves, professor da FGV, destacou que o momento eleitoral também deverá ter reflexos sobre o câmbio. A seu ver, o panorama do debate econômico entre as duas principais candidaturas por enquanto é o de um confronto de populismos. O mais grave problema a ser enfrentado pelo próximo governo é o desequilíbrio fiscal e há percepção de que o exercício do poder no próximo mandato dependerá do centrão, aduziu.
Para o economista, o novo patamar de equilíbrio da taxa de câmbio estará em torno de R$ 5,00. A incógnita na construção civil é que a alta da taxa de commodities não foi compensada por essa taxa e a economia chinesa está desorganizada. De qualquer forma, ele disse esperar que a nova taxa de câmbio, após um período de turbulência, acabe proporcionando alguma normalidade aos preços das commodities.
João Claudio Robusti, representante do SindusCon-SP na Fiesp, indagou se não haveria outro remédio para a inflação do que a elevação de juros. De acordo com Gonçalves, a inflação está resistente à alta da taxa de juros, mas se estes não continuarem subindo, isso levará a uma elevação da demanda por conta do alto volume de crédito, provocando mais inflação.
Capobianco observou que boa parte da inflação se deve ao aumento dos preços administrados e das commodities, assim a alta dos juros só estaria servindo para aumentar o custo da dívida pública. E comentou que, do ponto de vista das finanças públicas, hoje os Estados estão em melhor situação financeira que a União.
Gonçalves notou que a taxa de juros está ligeiramente acima da inflação, portanto a taxa real é baixa. Além disso, outras medidas, como o corte de despesas públicas, não ocorrem devido aos gastos compulsórios como o pagamento do funcionalismo. E dificilmente um governo populista mexeria nisso, comentou.
Matéria publicada no Sinduscon-SP